
O lobo ibérico em Portugal
No dia 15 de fevereiro de 2021, o ICNF foi informado da existência de dois cadáveres de lobo na região Norte, um na zona de Cabril, Montalegre e outro na zona de Rio de Onor, Bragança. Como resposta, a SPECO preparou alguns textos científicos que servirão como recursos pedagógicos, disponíveis para todos os que visitem o nosso website. Com estes textos pretende também mostrar o papel que os seus investigadores desenvolvem e que dá corpo a todo um trabalho de conservação ligado à Rede Internacional LTER (Long Term Ecological Research)
Quem é oLobo-IbéricoCanis lupus signatus

As Ameaças
O lobo-ibérico é abrangido por protecção legal nacional e internacional.
Em Portugal a Lei de Protecção do Lobo Ibérico, confere-lhe protecção adicional à Lei internacional dada pela Convenção de Berna, a Directiva Habitats e a CITES. No entanto, apesar de toda a protecção legal, o seu estatuto de conservação em Portugal é “Em Perigo” (EN).
A perseguição directa do ser humano ao lobo é uma das causas da população em Portugal estar em perigo (Petrucci-Fonseca et al., 2000), esta perseguição surge do que muitos agricultores, pastores e criadores de gado temem o “ataque” aos seus animais.
No entanto, é importante compreender que o gado não é a escolha preferencial do lobo, e que estes são forçados a alimentar-se de presas como ovelhas, vacas e cabras por duas grandes razões:
- A perda e destruição de habitat
- Escassez de presas silvestres.
A perda contínua de habitat do lobo e das suas presas naturais e a consequente humanização da paisagem e maior disponibilidade de animais domésticos, torna os rebanhos mais susceptiveis a ataques sempre que menos bem protegidos, o que leva a uma maior perseguição ao lobo. Este círculo vicioso de ameaça ao habitat e às presas naturais do lobo e à sua necessidade em procurar alternativas para se alimentar em locais com presença humana, tornam difícil a sua conservação.





A importância dos lobos no ecossistema

O lobo-ibérico, o maior predador português, é um dos animais mais perseguidos e incompreendidos do país. Os predadores têm uma importância intrínseca no equilíbrio do ecossistema no qual estão inseridos. O exemplo prático do Parque de Yellostone ilustra perfeitamente a importância chave de um predador de topo num ecossistema.[California Wolf Center]
Em 1926 o Parque Nacional de Yellowstone eliminou por completo toda a população lupina aí presente. O que se sucedeu foi uma cascata de eventos que alteraram por completo o ecossistema do Parque.
Sem a pressão predatória do lobo, a população da sua presa preferencial, teve um crescimento exponencial e começou a ser prejudicial para o habitat.
Os pequenos arbustos, salgueiros, choupos e outras plantas que impediam a erosão das margens dos ribeiros foram destruídos devido ao sobre-pastoreio.
A diminuição de árvores significa menos locais de nidificação para aves. A falta de árvores jovens afectou também as populações de castores que dependem destas para sobreviver – o problema tornou-se tão grave ao ponto de existir apenas uma população de castores no parque.
Sem a protecção vegetal nas margens os rios e ribeiros galgaram as margens e tornaram-se mais largos, menos fundos ao mesmo tempo que aumentaram a temperatura devido à falta da sombra providenciada pelos choupos e salgueiros que já não cresciam. E todas as espécies associadas ao sistema fluvial e ribeirinho – anfíbios, peixes e répteis – viram o seu habitat diminuído.
As populações de necrófagos e outas espécies, como a raposa, também foram afectadas devido à falta de carcaças resultantes das caçadas dos lobos.
Ascrenças e mitos
Desde sempre que o lobo faz parte do imaginário humano como um animal perigoso e malévolo. O “Lobo Mau” é um vilão comum a inúmeros contos e fábulas folclóricas como o “Pedro e o Lobo”, os “Três Porquinhos” a história da “Capuchinho Vermelho”.
O conflito entre Pessoas e Lobo parece datar do período medieval, altura em que a Igreja Católica utilizava o lobo como símbolo satânico, animal que punha em causa "o rebanho de Deus". O facto de o Lobo ser um animal com hábitos nocturnos fez crescer essa crença de ser um animal feroz e devorador de homens, mulheres e crianças.
O crescente contacto entre ser-humano e lobo levou ao aumento do simbolismo do lobo como um animal maligno, por atacar os rebanhos domésticos. Muitos mitos surgiram à volta deste predador, grande parte dos quais perdura até aos dias de hoje. Quais são e qual a sua veracidade?
Na verdade os lobos receiam e evitam o ser-humano, pois este desde sempre os perseguiu e atacou. Os poucos ataques a ser-humanos relatados, datam de há centenas de anos e são maioritariamente atribuídos a lobos doentes, que apenas estariam a defender-se. Além do mais, não é possível confirmar um único registo de um ataque de lobo a uma pessoa, na Europa.
A investigação sobre o Lobo em Portugal:Quem?Onde?

Onde
Devido à redução das suas presas e do seu habitat natural ao longo do séc. XX, o lobo-ibérico,que anteriormente se distribuia por todo o território ibérico, está restrito ao quadrante noroeste da Península. Em Portugal as populações existentes restrigem-se ao Norte, na região do Rio Douro.
Os investigadores consideram que o Rio separa as duas populações existentes no nosso país:
- A Sul do rio, na zona centro do país, uma população com cerca de uma dezena de alcateias encontra-se estável, mas isolada e fragmentada. Sendo esta região vital para a expansão do lobo é necessário assegurar uma conexão com a população espanhola.
- A Norte do rio, nas áreas montanhosas do Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro encontramos uma população estável. Constituída por algumas dezenas de alcateias esta população funde-se com a população espanhola.

A equipa LTER do Baixo Sabor acompanha há vários anos, as espécies de mamíferos mais emblemáticas, entre as quais o Lobo-ibérico.
Quem
Vários investigadores se dedicam à investigação do lobo ibérico em Portugal, do seu papel no ecossistema, a conservação e as suas relações com o ser humano. No CIBIO Francisco Álvares, doutorado pela Universidade de Lisboa, dedica a sua carreira de investigação ao Lobo Ibérico desde o seu doutoramento. Actualmente é coordenador científico do trabalho de investigação e conservação do lobo ibérico desenvolvido no CIBIO/InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto).
De forma a melhorar a conservação do lobo em Portugal, a equipa do CIBIO foca as suas linhas de investigação nas 3 áreas seguintes:
A investigação desenvolvida permite aos investigadores do CIBIO assegurar uma assessoria científica em várias iniciativas destinadas à conservação do lobo, junto de várias instituições, como por exemplo Munícipios, ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas), ONGAs (p.e. Grupo Lobo), ACHLI (Associação para a conservação do habitat do lobo-ibérico) e LCIE (“Large Carnivore Iniciative for Europe”, um Grupo de Especialistas da IUCN/SSC), as quais tem focado acções como a melhoria e gestão do habitat, minimização e compensação de impactes de infraestruturas, prevenção de ataques a animais domésticos, e valorização turística do lobo e do património cultural a ele associado, nomeadamente os Fojos do Lobo.
Francisco Petrucci Fonseca, investigador no cE3- Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais e a sua equipa dedicam-se à investigação de conservação do lobo ibérico, principalmente a relação predador-presa, o impacto das estradas na fragmentação do habitat e na mortalidade dos lobos, a demografia e dinâmica da população de lobos, medidas práticas de conservação relativas à protecção dos rebanhos contra predadores através da recuperação de antigas técnicas de protecção (ver - Programa Cão de Gado). Como Presidente e co-fundador do Grupo Lobo, dedica-se ao desenvolvimento de programas de educação ambiental e à analise do papel cultural do lobo no país.
O papel do Grupo Lobo
O Grupo Lobo é uma associação não governamental de ambiente, independente e sem fins lucrativos, reconhecido com o Estatuto de Utilidade Pública, fundado em 1985. É seu propósito trabalhar em prol da conservação do lobo e do seu ecossistema em Portugal.
Tendo em atenção os perigos que o lobo enfrenta e procurando assegurar a conservação deste predador ainda ameaçado no nosso país, e do nosso rico património natural, o Grupo Lobo desenvolveu uma estratégia para atingir esse objetivo, a qual designou por Programa Signatus.
As suas principais linhas de ação são:
Investigação aplicada
Educação e sensibilização ambiental
Promoção de medidas práticas de conservação
Exemplo prático - O Programa Cão de Gado – a redução do conflito Lobo-ser humano
Os cães de gado têm sido utilizados pelos pastores, como método de proteção durante centenas de anos e fazem parte do sistema tradicional de pastoreio utilizado em Portugal e noutros países do Mediterrâneo e da Ásia.




O sucesso do Programa Cão de Gado despertou um interesse crescente dos criadores de gado, traduzindo-se em pedidos frequentes de cães, bem como aumentou a sua confiança neste método de proteção, facilitando a sua expansão e o estabelecimento de uma relação de trabalho continuada com as comunidades rurais.
Saiba mais em: www.grupolobo.pt/cao-de-gado