
"Desafios emergentes nos ecossistemas costeiros: uma perspetiva de Saúde Planetária"
As zonas costeiras compreendem uma multiplicidade de ecossistemas altamente produtivos de elevada importância ecológica, económica e social. Enquanto áreas preferenciais para o estabelecimento de populações humanas, com cerca de 3,1 mil milhões de pessoas a residirem a menos de 100 km da linha de costa, os ecossistemas costeiros enfrentam pressões crescentes resultantes das diversas atividades antropogénicas, desde logo compreendendo o desenvolvimento urbano, agrícola e industrial, conduzindo a uma proporção cada vez menor de habitats costeiros em estado natural. Os impactos de origem antropogénica, aliados à variabilidade natural que caracteriza estas zonas de transição entre o ambiente terrestre e marinho, comprometem a resiliência ecológica e a capacidade dos ecossistemas costeiros para fornecer serviços essenciais, desde a regulação climática até à segurança alimentar, e em última análise comprometendo a saúde planetária.
Com o crescimento acelerado da população humana, o avanço tecnológico e o desenvolvimento das atividades antropogénicas num mercado globalizado, emergem novos desafios ambientais de elevada complexidade. Entre estes, destaca-se a presença ubíqua e a acumulação de contaminantes de origem difusa, como os fármacos e outros poluentes emergentes. Estes compostos, introduzidos principalmente através de efluentes urbanos e de práticas agropecuárias, persistem no ambiente aquático, mesmo em ambiente marinho, e interagem com os organismos de forma ainda pouco compreendida, afetando desde processos fisiológicos a comportamentais em diversos organismos, com potenciais repercussões a nível da estrutura e funcionamento dos ecossistemas. A sua presença pode também promover a emergência e disseminação de resistência antimicrobiana, com implicações profundas para a saúde pública e ambiental. Reforçando a interconectividade entre sistemas, estudos recentes associam a diversidade microbiana em águas costeiras e em peixes marinhos ao perfil de atividades humanas costeiras.
Outro desafio emergente prende-se com a introdução e expansão de espécies invasoras, facilitadas por alterações nos regimes hidrológicos, no clima e na crescente conectividade global. As subsequentes modificações nos fluxos de nutrientes, nas relações tróficas e na composição e estrutura das comunidades biológicas podem ter impactos significativos, na saúde humana, refletindo-se, por exemplo, na segurança alimentar, com o potencial aumento da exposição a novos agentes patogénicos e outros contaminantes. É também neste contexto que surge a necessidade de melhorar a rastreabilidade de alimentos de origem marinha, sustentando produtos seguros, de elevado valor nutricional, e obtidos por práticas mais sustentáveis e compatíveis com a conservação dos recursos naturais.
A resposta a todos estes desafios exige uma reflexão crítica sobre como promover a saúde ambiental é, simultaneamente, promover a saúde humana e assegurar um futuro ecologicamente sustentável. Tal resposta requer, portanto, uma abordagem integrada, baseada em ciência aberta e transdisciplinar, que o enquadramento da saúde planetária permite e fomenta.
"Ambientes vulcânicos e saúde planetária: uma análise à luz do microscópio"
Os ambientes vulcânicos, geralmente analisados através da lente dos riscos geológicos, também constituem laboratórios importantes naturais que nos permitem compreender as relações complexas entre o meio ambiente e a saúde. No arquipélago dos Açores, a atividade vulcânica não eruptiva — presente através de campos fumarólicos, de nascentes ricas em CO₂ e da desgaseificação difusa do solo — liberta uma mistura complexa de substâncias que afetam a saúde dos organismos, incluindo gases radioativos (como o radão), gases neurotóxicos (como o mercúrio elementar gasoso) e metais pesados.
Esta apresentação integra um conjunto de estudos multidisciplinares realizados neste arquipélago, com enfoque nos impactos dos poluentes de origem vulcânica na saúde dos solos e na qualidade do ar, bem como nos seus efeitos na saúde humana e de outros organismos. Os resultados destes estudos evidenciam o risco, muitas vezes invisível, de viver em zonas vulcanicamente ativas, salientando a necessidade de desenvolver estratégias integradas de saúde ambiental e de saúde pública.


"Economia Azul em Transição: Desafios e Caminhos para Restaurar a Saúde dos Oceanos"
Durante décadas, a economia foi vista, com razão, como uma força predadora do oceano: assente em sobre-exploração de recursos, poluição invisível e visível, lógicas de curto prazo e a procura constante de lucros que ignoram os limites ecológicos e planetários.
Mas e se, em vez de ser apenas parte do problema, a economia pudesse ser reprogramada para ser parte da solução?
Num mundo marcado por uma crescente instabilidade geopolítica, mudanças climáticas aceleradas e disputas por soberanias terrestres e marítimas e uso de recursos naturais, os oceanos tornaram-se palco de riscos globais — mas também de oportunidades para profundas transformações. A recente adoção do Pacto do Oceano da União Europeia aponta para uma visão obstinada de futuro sustentável e uma mudança de paradigma: uma agenda ambiciosa que alia transição ecológica, justiça social e liderança política na governação sustentável do oceano.
Nesta intervenção, convido a audiência a repensar o papel da economia na conservação e saúde do Oceano, analisando tanto as falhas sistémicas como as opções emergentes: desde o financiamento azul e mercados de carbono marinho, até novos mecanismos de governança transnacional e valorização do que ainda não tem preço: biodiversidade, serviços dos ecossistemas e integridade ecológica.
Mais do que uma análise técnica, esta conferência será um convite político e ético: por uma nova economia azul capaz de regenerar ecossistemas, reforçar a coesão entre povos e responder, com coragem, aos grandes desafios do nosso tempo.
"Ecologia e Conservação em Ecossistemas Insulares: Implicações para a Saúde Planetária"
Os ecossistemas insulares albergam um número desproporcionadamente elevado de espécies e comunidades ecológicas únicas, concentradas em apenas cerca de 5% da superfície terrestre. As ilhas são lar de uma parte significativa da população humana, contêm alguns dos habitats mais vulneráveis do planeta e a sua biodiversidade tem sido profundamente impactada por pressões antrópicas, tanto históricas como atuais. As ilhas são, em simultâneo, hotspots de biodiversidade e de extinções, responsáveis por mais de 60% de todas as perdas documentadas de espécies desde 1500, além de acolherem a maioria das espécies globalmente ameaçadas. Por exemplo, mais de metade da diversidade mundial de morcegos (~60%) ocorre em ilhas, sendo cerca de um quarto das espécies endemismos insulares. Nesta palestra, examinarei de que forma os ecossistemas insulares moldam a diversidade de vertebrados terrestres, salientando o seu papel como espécies-chave que fornecem serviços de ecossistema essenciais, bem como os desafios que surgem na interface entre alguns destes grupos e os seres humanos. Em seguida, abordarei os principais fatores de perda de biodiversidade em comunidades de vertebrados insulares, incluindo predadores invasores, degradação do habitat e sobre-exploração, considerando também como os vertebrados insulares ilustram dinâmicas ecológicas e evolutivas mais amplas nas ilhas. Com base em exemplos de diferentes regiões, discutirei de que modo os sistemas insulares funcionam como laboratórios naturais para compreender as alterações ambientais globais e como novas abordagens de monitorização, restauração e políticas de conservação podem contribuir para salvaguardar a biodiversidade insular. Por fim, refletirei sobre os desafios e oportunidades para reforçar a conservação insular e a saúde planetária através de colaborações mais estreitas entre académicos, gestores e decisores políticos.


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