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Prémio de Doutoramento em Ecologia 2023 - Filipa Soares, 1ª Classificada




Filipa Soares explorou as implicações taxonómicas e funcionais das extinções e introduções de aves em 64 ilhas oceânicas, distribuídas por três oceanos (Atlântico, Pacífico e Índico). Estes ecossistemas são dos mais ameaçados pelo impacto do Homem, para além das alterações climáticas a que estão sujeitos. Para a realização deste objectivo recolheu a riqueza específica da avifauna, as características funcionais de cada espécie, listou as espécies nativas, extintas, existentes e introduzidas e compilou as características biogeográficas e antropogénicas das respectivas ilhas, que potencialmente influenciam a diversidade de aves introduzidas. A inovação deste trabalho consistiu na utilização das características funcionais, para além das taxonómicas já utilizadas anteriormente por outros autores, para aumentar a compreensão dos impactos antropogénicos nas alterações espacio-temporais da diversidade taxonómica e funcional da avifauna. Com este trabalho é agora possível prever tendências futuras de evolução ecológica e propôr ferramentas globais para a conservação eficaz de ecossistemas resilientes e funcionais.


À conversa com esta investigadora a SPECO tentou saber um pouco mais sobre a motivação que a levou a assumir este desafio, os problemas e oportunidades que viveu, e que repercussões poderá ter este prémio alcançado.


1. O que esteve na base do desenvolvimento deste trabalho de doutoramento?

Quando comecei o programa doutoral tive um ano para definir o meu tema de tese. Durante este primeiro ano tivemos várias ideias, todas sempre à volta das ilhas. A ideia de estudar os impactos das introduções surgiu primeiro, no seguimento do trabalho que fiz durante o mestrado sobre as alterações do uso do solo como principais factores promotores da expansão de aves introduzidas na ilha de São Tomé. Os resultados deste trabalho sugeriram que as aves introduzidas nesta ilha não competiam com as aves nativas, o que nos levou a pensar se o mesmo acontecia também noutras ilhas oceânicas. As extinções só “apareceram” no segundo capítulo da minha tese, depois de descobrirmos que o padrão que vimos em São Tomé parecia existir noutras ilhas, ou seja havia uma diferenciação de nicho entre as aves nativas e introduzidas. Isto levou-nos, mais uma vez, a questionar se o mesmo padrão existia entre as aves extintas e as aves introduzidas. A partir dai várias ideias foram surgindo, algumas exploradas durante o doutoramento e outras ainda em lista de espera!


2. Ao longo do trabalho qual foi a sua maior alegria?

Pode soar estranho, mas a minha maior alegria foi talvez quando finalmente acabei de compilar todos os dados que precisava para fazer as análises dos últimos 3 capítulos. Estive quase 1 ano a construir a base de dados (entre outras coisas). Esta base de dados inclui todas as espécies nativas, extintas e introduzidas de cada uma das 64 ilhas, e todas as características funcionais de cada uma das espécies. Foi um trabalho um pouco aborrecido, mas essencial uma vez que condicionava todas as minhas análises. Quando finalmente acabou, posso confessar-vos que fiquei genuinamente contente!


3. Que desafios teve de enfrentar e que motivações arranjou para superar os seus problemas?

Creio que o maior desafio foi ter realizado o doutoramento durante a pandemia COVID-19. Comparativamente a alguns colegas, o meu trabalho não foi afectado directamente pelas restrições impostas durante a pandemia, uma vez que não dependia de trabalho de campo ou de trabalho de laboratório. Ainda assim, tinha planeada uma minha estadia em Montpellier, de 3 meses, para trabalhar directamente com a minha coorientadora, Dr. Ana Rodrigues, no CEFE - Centre d'Ecologie Fonctionnelle et Evolutive, que foi encurtada devido às restrições durante a pandemia. O doutoramento consegue ser um trabalho um pouco solitário e a pandemia veio a acentuar isso. Diria que a minha motivação se deve em grande parte aos meus orientadores, que apesar de estarem afastados, nunca deixaram de me apoiar. Quando surgiram as oportunidades online para participar em conferências e cursos, foram os primeiros a incentivar-me. Acabei por fazer 3 apresentações online em encontros e conferências, entre as quais a Early Career Biogeographers Conference, onde curiosamente conhecia a investigadora Dr. Céline Bellard, que mais tarde arguiu a minha tese!



4. O que ficou por explorar?

Muitas coisas! Consigo listar muitas perguntas que ficaram por explorar. Algumas surgiram durante a tese e outras apareceram depois. Uma das ideias mais interessantes e que surgiu durante o meu doutoramento foi explorar as mesmas questões olhando também para a diversidade filogenética. Esta componente da biodiversidade é muitas vezes resumida como a medida da diversidade de uma comunidade que incorpora as relações filogenéticas das espécies, sendo muitas vezes utilizada como proxy da diversidade funcional. A nossa ideia era tentar investigar as duas componentes em paralelo, de modo a compreender se os impactos seriam semelhantes ou não (e quando não porquê e em que medida). Outra ideia, foi estudar as mesmas questões com outros grupos taxonómicos, nomeadamente as plantas, que também foram largamente introduzidas em ilhas.


5. Quais serão os próximos passos da sua carreira? Esta é uma pergunta difícil para alguém que quer seguir a carreira de investigação em Portugal. Posso começar por dizer o que disse na minha entrevista para o doutoramento: na altura perguntaram-me porque é que queria fazer o doutoramento, e eu respondi que o meu grande objectivo era um dia ser professora na Universidade. Disse-o na altura e continuo a dizê-lo hoje, no entanto, agora sei que o percurso vai ser bastante mais “atribulado”. As oportunidades são escassas e a competição é elevada. O passo a seguir ao doutoramento foi procurar oportunidades para continuar na investigação, idealmente em Portugal. Não conseguindo ficar em Portugal, segui rumo a Paris (França), onde comecei um postdoc no Centre d'Écologie et des Sciences de la Conservation. Os próximos passos serão tentar voltar para Portugal ou continuar em França. De momento, estou a preparar uma candidatura para permanecer em Paris, mais tenciono fazer outras candidaturas para Portugal. Não excluo a hipótese de ir para outro país, tudo vai depender das oportunidades que surgirem. Talvez apareça uma grande oportunidade à qual não consigo dizer que não!


6. O que a levou a concorrer a este Prémio? Soube dos Prémios de Doutoramento em Ecologia da SPECO no ano passado, durante o 21º Congresso Nacional de Ecologia, que decorreu em Aveiro, em conjunto com o 2º Encontro da Sociedade Ibérica de Ecologia (SIBECOL) e 21º Congresso da Associação Ibérica de Limnologia (AIL). Curiosamente foi o meu primeiro congresso presencial após a pandemia, tendo apresentado um dos meus trabalhos de doutoramento. Na altura estava à espera para defender a minha tese e lembro-me de pensar que devia candidatar quando terminasse o doutoramento. Quando vi o anúncio da abertura das candidaturas decidi candidatar-me, sabendo que era uma oportunidade única para ganhar visibilidade dentro da comunidade de ecológicos em Portugal.



7. Que impacto espera obter com este resultado? Gostava que este resultado aumentasse a visibilidade do trabalho que fiz durante o doutoramento, principalmente dentro do país. Estou contente por ver que apenas a divulgação dos resultados do prémio na página da SPECO e na revista Wilder já contribuiu para este objectivo. Para além da grande exposição dentro da comunidade de ecólogos em Portugal, a SPECO é também uma interface entre a ciência e a sociedade, promovendo a sensibilização dos cidadãos e contribuindo para uma sociedade mais participativa. Os vários canais de comunicação da SPECO permitem chegar a uma grande variedade de públicos. Por fim, o convite da SPECO para apresentar o meu trabalho no próximo Encontro Nacional de Ecologia (ENE) vai ser mais outra oportunidade para dar a conhecer o meu trabalho a uma comunidade científica mais alargada, incluindo investigadores nacionais e internacionais importantes na área da Ecologia.

8. O que gostaria de ver na SPECO que impulsionasse os jovens a seguir investigação em Ecologia?

Penso que a SPECO tem uma posição única para atingir este objectivo. Na minha opinião, que é pouco informada sobre as dificuldades de colocar em prática ofertas de formação, eu diria que a criação de cursos formativos em várias áreas da Ecologia são uma boa forma de incentivar os jovens a seguir investigação em Ecologia. Outra sugestão mais simples, mas que penso que a SPECO já faz com bastante empenho, é a divulgação de trabalhos científicos, conferências, encontros, projectos e notícias da sociedade na área da Ecologia nas suas plataformas (por exemplo, página, Twitter).


9. Como tenciona contribuir para aumentar a visibilidade da SPECO? Para aumentar a visibilidade da SPECO, tenciono divulgar as actividades da SPECO, bem como as suas notícias. Ainda, vou aproveitar a rede social Twitter como plataforma para partilhar as notícias da SPECO, aumentando assim a sua exposição ao público em geral. Sendo sócia da SPECO vou assumir um papel mais activo na divulgação das suas iniciativas e projectos, dando também a conhecer o papel activo da SPECO na área da intervenção.


10. Que conselhos gostaria de dar aos jovens estudantes de doutoramento? Na minha opinião, um dos melhores conselhos que posso dar a um estudante de doutoramento é trabalhar em algo de que gosta verdadeiramente. Diria que a pessoa que tem mais interesse no nosso trabalho durante o doutoramento somos nós, pelo que tem de ser um tema que nos interessa bastante e, até me arrisco a dizer, com o qual nos identificamos. Outro conselho que gostaria de dar é trabalhar com pessoas de quem gostamos e admiramos. Os orientadores são um factor muito importante para o sucesso de um doutoramento. Eu tive bastante sorte, pois dois dos meus orientadores também orientaram o meu mestrado, tendo tido assim uma oportunidade de fazer um test-drive antes do doutoramento! O último conselho é partilharem as vossas frustrações com os vossos colegas e amigos. Para mim, eles também foram essenciais para o sucesso do meu doutoramento! O doutoramento tem muitos altos e baixos, e é fácil perdermos o rumo e a esperança, no entanto, tal como um dos meus orientadores dizia “vais ver que quando olhares para trás, esta fase terá sido a melhor fase da tua vida!”. E agora olhando para trás, o Professor Jorge Palmeirim tinha razão!

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