Miriam Romagosa Verges, investigadora no Okeanos (Instituto de Investigação em Ciências do Mar), da Universidade dos Açores, foi a segunda classificada no Prémio de Doutoramento 2022. O seu trabalho, intitulado “Exposição ao ruído subaquático e comportamento vocal das baleias de barbas nos Açores” determinou, pela primeira vez, os níveis do ruído produzido pelo tráfego marinho em relação ao comportamento vocal das baleias, e sublinhou a necessidade de uma monitorização contínua dos níveis de ruído subaquático para avaliar os possíveis impactes das actividades humanas e apoiar o planeamento e implementação de acções de conservação dirigidas a este grupo de cetáceos.
As baleias comuns (Balaenoptera physalus), azuis (B. musculus) e sardinheiras (B. borealis) produzem vocalizações de baixa frequência e grande amplitude associadas a funções vitais, como a reprodução, socialização e alimentação. O objectivo da tese foi investigar o comportamento vocal destas três espécies (com ênfase na baleia comum) para compreender a sua ecologia comportamental durante a migração, fase menos conhecida do seu ciclo de vida.
Através da análise de um extenso conjunto de dados acústicos recolhidos nos Açores e em diferentes regiões do Atlântico Norte, este trabalho demonstrou a presença contínua das baleias comuns e azuis no arquipélago entre o outono e a primavera, e revelou uma mudança sazonal no seu comportamento e na função do habitat dos Açores.
Este trabalho também investigou a função da vocalização de 40-Hz da baleia comum, descobrindo uma associação positiva com a biomassa das presas, constituindo a primeira evidência directa de uma função desta vocalização associada à alimentação. O estudo das canções desta espécie revelou mudanças rápidas e graduais no conteúdo temporal e espectral das canções ao longo de duas décadas, que, pela primeira vez, demonstram a existência de revoluções e evoluções culturais, e de aprendizagem social na espécie.
Por último, a medição dos níveis de pressão sonora do ruído subaquático nos Açores revelou valores geralmente baixos. No entanto, desconhece-se se os níveis de ruído observados poderão, ainda assim, mascarar as vocalizações das baleias de barbas.
Em conclusão, este trabalho contribui novas informações sobre o comportamento vocal das baleias comuns, azuis e sardinheiras durante a migração, fornece novas pistas sobre a função de dois tipos de vocalizações de baleia comum e demonstra que, nesta espécie, as canções são culturalmente transmitidas. No geral, os resultados deste trabalho contribuem para um melhor conhecimento da ecologia de três espécies de baleias de barbas, e poderão ser usados para a identificação futura de habitats funcionais.
A SPECO esteve à conversa com Miriam Romagosa para compreender um pouco o seu percurso, passado e futuro desta recém investigadora marinha.
1 | Qual foi a motivação para desenvolver este projecto?
A minha experiência profissional prévia em bioacústica e ruído subaquático despertou o meu interesse para cursar um doutoramento focado nestes temas e logo se deram as condições óptimas para o realizar na Universidade dos Açores.
2 | Alegrias e sucessos durante o seu projecto
Tive muitas alegrias. Uma delas foi poder fazer um estágio no Woods Hole Oceanographic Institute, um dos lugares onde se estudaram pela primeira vez as vocalizações de baleia comum.
Outra foi poder publicar na prestigiada revista “Proceedings of the Royal Society B”.
3 | Que desafios encontrou, e como os superou?
Tive que aprender de zero a fazer modelos estatísticos que foram muito úteis, mas levei muito tempo a aprender. A motivação que me ajudou a superar este e outros desafios foi sempre a minha paixão pelo tema do doutoramento.
4 | Que novas questões surgiram?
Muitas coisas! Por exemplo, não sabemos porque é que as frequências e ritmos das canções das baleias comuns e azuis estão a mudar e há um grande desconhecimento sobre os efeitos do ruído subaquático na comunicação destas espécies.
5 | O que está em vista num futuro próximo?
Se for possível, gostaria de continuar na carreira científica investigando o que ficou por explorar na minha tese de doutoramento.
6 | Porquê concorrer ao Prémio de Doutoramento da SPECO?
Uma amiga que ganhou este mesmo prémio há alguns anos, falou-me desta oportunidade e animou-me a candidatar.
7 | Quais os impactos deste prémio?
Espero que venha a melhorar o meu CV e ter mais oportunidades de obter bolsas/contratos de pós-doutoramento.
8 | Qual a sua opinião sobre a SPECO como promotor dos jovens ecólogos?
Seria importante a SPECO continuar ajudar os pós-doutorados a iniciar a carreira científica porque às vezes há uma paragem entre o doutoramento e o pós-doutoramento, o que pode levar as pessoas a desistir da carreira científica.
9 | Qual será a sua contribuição como membro da SPECO?
Divulguei o prémio em todos os media sociais assim como no meu centro de investigação. No futuro vou fazer o mesmo com todas as notícias da SPECO.
10::| Que conselhos deixa aos jovens e futuros ecólogos?
O meu conselho é ter muita paixão pelo tema do doutoramento e conseguir ter um bom supervisor.
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