O que terá Francisco Pina-Martins a dizer sobre o seu trabalho (e não só!)? A SPECO quis saber a opinião do vencedor do primeiro lugar no Prémio de Doutoramento em Ecologia Fundação Amadeu Dias 2019.
Francisco Pina-Martins é Professor assistente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e investigador no grupo de Biologia Computacional e Genómica Populacional do cE3c - Centro de Ecologia, Evoulção e Alterações Ambientais. É ainda Professor adjunto convidado no Instituto Politécnico de Setúbal. Os seus interesses de investigação recaem sobre as áreas de Biologia Evolutiva, Bioinformática e Biologia Computacional, com foco especial na«a detecção de seleção natural, desenvolvimento de software científico e sequenciação de nova geração, bem como na utilidade destas disciplinas na resolução de problemas do contexto ecológico. Francisco admite estar sempre à procura de novos desafios nestas áreas, ou de novos métodos que exijam uma implementação.
1 Qual ou quais as perguntas que estiveram na base do seu projecto de doutoramento?
Resumidamente, este projeto assentou essencialmente em 2 questões biológicas centrais - a) Conhecer melhor a história evolutiva do sobreiro (Quercus suber), com base numa perspetiva que a tecnologia disponível não permitia até então, e b) ter uma noção de como a seleção natural afeta o sobreiro, e qual o seu papel na moldagem do fundo genético da espécie - e tudo o que isso acarreta.
2 Que resultados deixaram mais satisfeito?
Do ponto de vista técnico, sinto-me bastante orgulhoso das ferramentas que criei, com vista a automatizar e acelerar o processo de análise de dados, que hoje em dia estão a ser utilizados pela comunidade científica no geral, e não só por mim. Também estou muito satisfeito com a reprodutibilidade que consegui com o processo de análise de dados. Do ponto de vista científico, o que me deixa mais satisfeito é o resultado do “Risk of non-Adaptedness”, que permite tirar ilações muito práticas relativas ao futuro do sobreiro e dos montados.
3 Qual ou quais os principais desafios que enfrentou? Como conseguiu superá-los?
Apesar das questões biológicas colocadas terem sido difíceis de responder, creio que o maior desafio foi técnico. Isto porque quando o projeto de tese teve início, muitas das técnicas utilizadas eram ainda “experimentais”. E isso trouxe consigo um conjunto de desafios de análise muito complicados. Foram ultrapassados com alguma criatividade, muita perseverança, e principalmente, com a automatização de grande parte da análise.
4 O que ficou por explorar?
Como é comum em ciência, este trabalho fez-me colocar mais questões que aquelas que respondeu. Ficaram por explorar métodos multi-variados de procura de associações genótipo-ambiente, quantificar o peso da adaptação local na resposta do sobreiro às alterações climáticas, perceber até que ponto a hibridação entre o sobreiro e outros Quercus é importante na resposta a essas mesmas alterações, testar até que ponto a migração assistida pode ajudar na adaptação a essas mesmas alterações, explorar o papel de alguns genes identificados como importantes na resposta às alterações num estudo de “caso-controlo”… Há tantas outras…
5 Quais serão os próximos passos enquanto investigador?
Este ano comecei a lecionar na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e no Instituto Politécnico de Setúbal, e como foi o meu primeiro ano como docente acabei por ter menos tempo para investigação que o que gostaria. Mas estou a trabalhar num projeto similar ao do sobreiro do ponto de vista técnico, mas num complexo de espécies do género Limonium. Também estou a tentar aplicar as metodologias desenvolvidas no âmbito da tese num estudo de larga escala com centenas de datasets. Por isso, continuo a “batalhar” em duas frentes - uma científica e outra técnica.
6 O que a levou a concorrer ao Prémio?
Estava casualmente a debater um dos aspetos da tese com uma pessoa por quem tenho muito apreço académico, que me recomendou a candidatura. Acabou por ser um dos melhores conselhos que já me deram.
7 Que impacto espera que o Prémio tenha na sua carreira e no seu trabalho?
Este prémio é muito prestigiado a nível nacional, e pode pode vir a abrir portas no futuro. Como jovem investigador, cada linha no CV ajuda, e esta com certeza que ajuda e muito! Espero também que já durante o EEF Lisbon 2019 também sirva como facilitador de “networking”.
8 O que tem a dizer sobre a investigação em Ecologia em Portugal?
Portugal é um país geograficamente privilegiado para fazer investigação em Ecologia. A Península Ibérica é um hotspot de biodiversidade e os investigadores nacionais conseguem tirar partido disso e publicar trabalhos “world class” na área. No entanto, sofre dos mesmos males que toda a investigação em Portugal: sub-financiamento, especialmente em recursos humanos, pouca participação por parte de entidades privadas (neste aspeto, felizmente começam a ver-se algumas mudanças, apesar de grande parte do financiamento da investigação ser proveniente de fundos públicos) e falta de sustentabilidade (do ponto de vista que é muito difícil criar um projeto de investigação a longo prazo).
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